LA LA LA RESSSONANCE

LA LA LA RESSSONANCE
NA TERTULIA CASTELENS
REPORTAGEM E ENTREVISTA
MAIA
20 MARÇO 2010

Metamorfose. Não tem mas até poderia ter ligação com a obra de Kafka, dado que os La La La Ressonance são isso mesmo em relação aos The Astonishing Urbana Fall, ou seja, a mesma banda mas que algures se redefiniu por assim dizer.

Se The Astonishing Urbana Fall era aquele passeio pela cidade sem rumo predestinado, La La La Ressonance é a própria cidade, com os seus cheiros, caminhos, fumos, ruídos, e pessoas que nela passeiam.

Em 2006, essa redefinição deu forma ao álbum “Palisade”, e já em 2009, lançam “Outdoor”.

O som? Jazzistico, um estudo instrumentalista onde a técnica segue o músico para locais abstractos (a tal palavra multi-usos). Entrar neste mundo é despir-se de convenções automatizadas pela mecanização de tudo que somos e fazemos. Favor deixar todas as ideias pré-concebidas.

Com a sala quase cheia, desfilaram temas de ambos os álbuns, com um empenho só comparável ao excelente desempenho. A audiência dividia-se entre olhares hipnotizados e expressões da mais profunda confusão assim como total incompreensão.

Os aplausos surgiam quer no final dos temas, quer no auge de uma passagem mais inebriante.

Falamos aqui de músicos e de um projecto que tem sonorizado obras de alguns dos mais conceituados realizadores de animação contemporânea. Não devem provas de qualidade a ninguém, e este concerto deixou isso bem claro.
Para apreciadores do género e amantes de excelente musica.



ENTREVISTA
após concerto com André Simões e Gil Teixeira

Contem-me como foi essa passagem de “The astonishing urbana fall” para “La La La Ressonance”, o desenrolar dos eventos até ao dia de hoje. É uma revolução?

André Simão- Sim, uma revolução. Ou se calhar uma evolução. O que aconteceu é que ao fim de 10 anos íamos fazer o álbum, e quando começamos a gravar não soava nada a “urbana fall”… tínhamos acordo com agentes, editoras etc., e tivemos de conversar sobre o assunto e percebemos que o que estávamos a fazer não era a mesma matriz da banda que tínhamos há 10 anos.

Tivemos de mudar o nome, porque uma nova identidade sonora assim o requeria. No fundo a banda começa com o 1º disco. Claro que tivemos de explicar a toda a gente envolvida o que estava a acontecer, e com alguma luta houve acordo, acabamos por editar em 2006 o “Palisade” e fizemos uma série de concertos de promoção.

Nessa altura tínhamos decidido que íamos ser mais musicais, ou seja, debruçarmo-nos mais sobre a música, em contraponto ao que acontecia enquanto “urbana fall”. Aí apercebemos que há uma evolução e acabamos por não conseguir resistir a este apelo dos filmes e uma série de colaborações, e no fundo acabamos por recuperar o lado mão cénico e performativo dos “urbana fall”.

Entretanto gravamos o 2º disco, e a aventura continua.

Musicalmente, e em relação a “The astonishing urbana fall”, juntaram então um experimentalismo mas mais objectivo ou como se passa nesse aspecto?

Gil Teixeira- Eu acho que se calhar nos La La La há mais conteúdo… eu já entrei a meio dos “urbana fall”, por isso tenho a experiência como espectador e como membro.

Acho que abandonamos aquele carácter quase épico, aquelas cavalgadas sem fim onde se deixava tudo em aberto e em que havia muito, mas muito improviso, uma experimentação não tão arrojada a nível musical, ou seja, não era uma experimentação tão melódica ou harmónica, mas sim mais pelas texturas que se criavam, era mais em termos de performance.

Nos LLL é em outro sentido, em termos de síntese de elementos aparentemente paradoxais, de origens musicais que em princípio nada teriam a ver umas com as outras e fazer uma fusão que chegue a um produto final que tenha muito pouco espaço para improvisação, ou seja ao contrário dos “urbana fall” em que estava por todo o lado, nos LLL temos pequenos nichos de improvisação mas que fase final, quando os temas estão já definidos e quando já os apresentamos, existem certos momentos para improvisação, mas de forma geral é um trabalho é muito mais cirúrgico, muito mais cerebral, no fundo um trabalho de composição mais pensado.

As influências, a julgar pelo vosso som, são das mais variadas. Falem-me disso.

André- Quanto ao que ouvimos, e isto não é fantasiar á volta das personagens da banda, é mesmo verdade: nós ouvimos todos músicos diferente…

O Gil por exemplo é talvez o mais académico de todos, trabalha com música, tem uma ligação forte á música clássica e erudita, o Paulo ao jazz, o Ricardo ao rock, eu mais á pop, portanto coisas completamente diferentes…

Gil- Nunca dizemos o que é que o Jorge (baterista) ouve…

André- É uma espécie de diamante em bruto, não sabemos muito bem o que é que ele ouve, ele não se pronuncia muito, basicamente é uma criatura sem rede, que aterra em cima dos temas como um meteorito, é mais ou menos isso. É o musico mais solto da banda

Sim, o que é espantoso. A bateria fica sempre um bocado presa pela rítmica, mas ele não se prende, sempre a mudar de rumo, explora…

André- No nosso caso, os nossos papéis estão um bocado invertidos, e essa é uma das coisas que fomos descobrindo com esta nova direcção tomada enquanto LLLR. É que os lugares das harmonias estão como que fora do sitio, os próprios músicos parecem fora do sitio, e mesmo a estrutura convencional de uma canção e da maneira que ela se desenrola, que é um traço muito único dos LLLR, é o facto dos instrumentos de base como o baixo e a bateria estão sempre a cantar, enquanto que o Ricardo (guitarra) tem muito mais função de base do que o baixo e bateria, ou seja, há uma “estranheza” porque dá-se uma troca de papeis.

É como ter uma voz em 2º plano que se ouve mais, e a que está em 1º é mais baixa. Na questão que falaste de improvisação, ao contrário do jazz, onde em cada tema existem espaços para que cada músico faça a sua coisa, agora um depois outro, connosco passa-se mais da seguinte forma: acordamos entre nós que dado tema fica mais entregue a tal músico, e assim por adiante entendes… mas deixar espaços tipo 2 minutos onde não existe nada e onde um de nós cria algo sobre esse tempo, não, isso não acontece. Os temas são muito estruturados, são mesmo canções. Claro que existem momentos e instrumentos que são mais dados ao improviso, como nas percussões, e o saxofone que é um instrumento solo, mas de resto um tema tem uma duração que vem da tal estrutura e composição.

Em termos de decisões musicais, suponho que tem um sistema, dado o tipo de som. Como se passa?

André- Há porrada!

Gil- Neste momento, e sobretudo na composição para este 2º disco, lá está, dadas as sinergias deram-se colaborações e a musica foi acontecendo, como quando compomos para bandas sonoras (de cinema experimental etc.), existem sempre temas que gostamos mesmo e que aproveitamos porque tem a ver com o que estamos a fazer, mas na garagem, nos ensaios onde se compõem, as pessoas estão á solta, não há muito diálogo, e as pessoas vão entrando, as colheradas vão-se metendo e nós já funcionamos de forma muito orgânica portanto não há muita conversa nessa fase.

Numa 2ª fase, agora que temos matéria-prima começamos depois a lapidar e começa a dar-se a troca de ideias, e aí há uma fase de aceso debate.

Qual o rescaldo do álbum “Palisade”?

André- Nós ainda estamos a ressacar do 2º disco, ainda está muito presente, ainda é muito fresco, é tipo o filho recém-nascido, traquina e ainda nos dá que fazer. O 1º álbum, acho que unanimemente, adoramos o 1º disco. Deu-nos imenso gozo fazer o disco, promovê-lo e nesse sentido não podíamos estar mais satisfeitos com ele. Foi mesmo um processo de epifania, aliás, aquilo que surgiu foi de tal ordem que não hesitamos em alienar 10 anos de história e o nome que existia, com que já tínhamos feito algum caminho.

Foi um momento muito importante para a banda, pelas razões que expliquei.

Consideram o “Outdoor” mais directo, mais facilmente assimilável? Não falo em termos comerciais mas sim de sonoridade.

André- Se a pergunta é se as pessoas podem entender mais facilmente o que quisemos dizer com o disco, sim, sem duvida nenhuma. É um discurso muito mais directo, acho que qualquer pessoa consegue percebê-lo com muito mais facilidade quais são as intenções por detrás do disco. As intenções artísticas, musicais, etc.

O 1º álbum é muito mais críptico, muito difícil perceber onde é que estes gajos querem chegar, as referências, como se organiza um álbum que ora é electrónica, depois é pop, depois é frágil, depois é forte, etc.

Este não. Sem que isso seja um handicap, para um álbum ou outro, acho que este é bem mais assimilável sem dúvida.

O que sentem em relação á morte anunciada de um trabalho musical como um todo para ser vendido quase “às fatias”, a tal morte do álbum?

Gil- Eu ainda hoje vou no carro e ouço da 1ª faixa até ao fim dos álbuns… e sei que existem lá músicas muito fraquinhas, mas faz parte do conceito do álbum. Aliás, aliado ao conceito do álbum está o conceito da dinâmica, e é muito importante. Até essas faixas fraquinhas cumprem uma função, para dar força às faixas fortes. Depois existem as pessoas que escolhem 3 ou 4 faixas fortes e só ouvem aquilo, e dá-se uma “mesmidade” ou seja, perdem a tal força.

Essa é uma questão muito pertinente. Faz-me muita confusão encarar temas soltos, e isso de “agora fazemos um tema, daqui a uns meses outro”.
Um álbum tem um conceito, é um espelho de um grupo de pessoas, e se tirarem essa continuidade, deixa de fazer sentido.

André- Eu acho que a técnica não pode ditar a forma como a música é feita. Não é porque agora se pode descarregar um tema ou mesmo um álbum da internet que se vão fazer musica limitada a esse ponto.

Existe uma convenção testada e que se afirmou ao longo de séculos. Uma sinfonia tem uma hora mais ou menos, porque se tivesse 3 horas, a ideia não passava porque se perdia em tanto tempo, ou em 20 minutos porque era pouco tempo para se formar. Assim como no cinema.

Mas isso é uma decisão que assiste às bandas e aos músicos etc. Já existem bandas que lançam vários EP’s de 3, 4 músicas e vão fazendo e lançando. É uma forma de estar.
Eu pessoalmente, todas as bandas que gosto e que ainda estão no activo, não vejo sentido entrarem nesse sistema.

Agora se dá mais lucro? Claro que sim, sem dúvida.

A técnica é que tem de se adaptar á música e não o contrário. Até porque isso está testado, desde há séculos com as sinfonias e agora aos álbuns. O tempo médio são os 60 minutos, não é mistério nem segredo para ninguém.

Claro que no cenário de música mainstream isso acontece, mas aí a questão é outra.

Já a Madonna quando lançou o single “Like a virgin”, também lançou o Lp. E se calhar vendeu mais o single do que o álbum. Não é nada de novo no mundo da música mainstream.
Por isso eu acho que o álbum não está em perigo, até porque as vagas de música comercial vem todas de música mais séria.

Tem uma meta a longo prazo que gostariam de atingir ou é mais passo a passo?

André- Metas são os projectos que temos, e que depois se calhar daqui a 2 anos dão origem a um novo álbum, é mais por aí.

O que é o sucesso para vocês? O que é que vocês encaram como tal?

André- Não é uma pergunta fácil. Em 1º plano é a satisfação, no nosso caso é, que começa no local de ensaio e depois quando a malta se olha e diz “fizemos um bom álbum” ou “demos um bom concerto”.

Gil- A satisfação passa por ser realista. Eu diria que no nosso caso seria continuarmos a fazer o que gostamos com o gozo que nos dá neste momento, sendo possível conciliar as nossas agendas, etc.

Sucesso = Prazer?

Gil- Sim, eu diria que sim. Acho que a fruição é o maior sucesso. Conheço muita gente para quem a música é um negócio, e que grama muitos fretes, tocam o que não gostam porque tem de ser etc. Por isso acho que sim, o sucesso é mesmo fazer o que queremos com gozo. Se pelo caminho vier uma digressão europeia, ok, pode ser!

André- Claro que depois há ambições mais comezinhas, sejam terrenas ou banais.
Saber que se vai chegar a uma sala adequada ao nosso universo e vai estar cheia, que numa edição de um nº de exemplares “decente” a recepção é boa, etc., claro que ter um feedback positivo é bom! Dá força e energia para continuar.

A Imagem do Som deseja-vos esse tal sucesso, e se possível mais ainda!


REPORTAGEM (FOTOGRAFIAS E TEXTO)
E ENTREVISTA : RICARDO COSTA



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