DIABO NA CRUZ

DIABO NA CRUZ

Música Popular Portuguesa + Rock = Diabo na Cruz.


Porto, Cinema Passos Manuel
5 de Março de 2010




Era um público expectante, aquele que, rapidamente, foi entrando para o auditório do Passos Manuel. Fosse pela genialidade única com que esta banda veste de rock a música popular portuguesa ou, simplesmente, pela curiosidade em atestar até que ponto a qualidade da sua prestação ao vivo se equipara à sua qualidade em estúdio, a expectativa estava lá e sentia-se.
Os Diabo na Cruz subiram ao palco ao som da primeira ovação da noite e tomaram conta dos seus instrumentos. Sem peneiras e muito low profile. E logo se viu que estavam ali para tocar a sério. Pouco passava das 23h15. Estava uma noite chuvosa e fria, no Porto. A sala também não estava particularmente quente... pelo menos até então.

O arranque do espectáculo foi muito bem conseguido, com os primeiros minutos a resultarem num verdadeiro crescendo de som, de emoção e de ansiedade.

Jorge Cruz, o impulsionador deste projecto musical, dirigiu-se pela primeira vez ao público com um “Boa noite, nós somos os Diabo na Cruz!”.

Logo a seguir, quando os primeiros acordes de “Tão lindo” se fizeram ouvir, muitas foram as pessoas que acharam que o som dos Diabo na Cruz não é para se apreciar sentado. Deste modo, as laterais do auditório ficaram repletas de gente, com apenas escassos minutos decorridos desde o início do concerto. Mas nem por isso deu a sensação de ter passado a haver mais lugares sentados, facto que B Fachada não deixou passar em claro da primeira vez que se dirigiu ao público, ao manifestar o seu espanto (de forma muito peculiar) em ver um Passos Manuel tão cheio.

E assim continuou a festa.

Os Diabo na Cruz fizeram desfilar, ao longo de cerca de 80 minutos de espectáculo, os temas do seu primeiro CD, intitulado “Virou!”, e mostraram como se toca (muito bem) aquilo a que começa a ser convencional chamar-se “rock popular português”. E é lícito afirmar que poucas bandas terão conseguido até hoje uma simbiose entre música popular portuguesa e rock tão feliz, e tão bem conseguida, como eles.

As polifonias vocais, cuja qualidade sobressai definitivamente no trabalho de estúdio da banda (e que é uma das suas imagens de marca), mantiveram ao vivo a seu acuidade técnica e o seu rigor de execução. Rigor esse que, de resto, deve ser justamente estendido à execução instrumental.

Na bateria, João Pinheiro demonstrou que é um extraordinário músico e marcou o ritmo do início ao fim, ora lento ora menos lento, sempre concentrado e sempre dedicado.

Como se já não houvesse um João Gil talentoso na música portuguesa, os Diabo na Cruz fazem-se acompanhar de outro. Este João Gil, todavia, não é guitarrista; está sentado atrás dos “sintes” (como a própria banda refere no seu CD), e participa na construção do complexo harmonioso debitado por este conjunto.

Os sons graves, aqueles que sentimos mais no corpo do que nos ouvidos, vieram do baixo de Bernardo Barata, que mostrou ser uma fonte de energia e de boa disposição; está sempre a rir enquanto toca, mas nem por isso toca menos bem.

B Fachada tocou viola braguesa todo o concerto, reconfirmando assim outra das imagens de marca da sonoridade da banda – é também aquilo a que se chama uma verdadeira “Imagem do Som”... Ele é a alma das harmonias vocais dos Diabo na Cruz, cantando com e sem instrumento. Para além disso, dança e bate palmas descomplexadamente durante todo o concerto, e respira e transpira música por cada poro. É uma alegria de ver em palco.

Jorge Cruz foi, a par de vocalista principal, o guitarrista de serviço da noite. Possuidor de um alcance vocal muito extenso e uma pujança extraordinária, esteve sempre muito seguro e comunicou eficazmente com a audiência deleitada do Passos Manuel. Grande músico!

A interacção com a audiência foi engraçadíssima ao longo de todo o espectáculo, com rasgos intelegentíssimos e carregados de humor por parte dos músicos, muitas vezes reagindo a provocações soltas saídas da plateia. O público portuense, que se revelou atento ao percurso da banda e dos restantes projectos musicais dos seus membros, tratou muito bem os Diabo na Cruz, e cantou muito com eles durante todo o espectáculo. E eles retribuíram com uma entrega total, o que resultou num concerto que não será esquecido tão depressa.

Depois do fim, houve direito a encore e à repetição de “Dona Ligeirinha” – o tema mais ouvido de “Virou!”, que é efectivamente uma pérola musical.

Estes Diabo na Cruz são mesmo uma verdadeira lufada de ar fresco no panorama musical nacional actual, e dentro da música popular portuguesa em particular. Têm um espectáculo que cativa, tocam e cantam (oh, se cantam!) extraordinariamente bem, e são muito comunicativos.

Tenha este país a capacidade para potenciar aquilo que de melhor tem do ponto de vista artístico, e vão seguramente dar que falar nos próximos tempos. É que no Passos Manuel “Virou!” o disco... mas não tocou o mesmo.
















ENTREVISTA COM JORGE CRUZ - PARTE 1

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